O Maior Amor do Mundo

Originalmente publicado em www.cenadecinema.com.br (06.09.2006)

Crítica do filme “O Maior Amor do Mundo” (Cacá Diegues).

Bill Murray Canarinho
O décimo sexto longa de Cacá Diegues, quarto que escreve sozinho, segundo o próprio foi mais difícil de filmar do que sua obra anterior “Deus é Brasileiro”, onde Deus (Antônio Fagundes) percorre várias cidades brasileiras. Apesar de a história de O Maior Amor do Mundo se desenrolar em uma única favela, foi necessário filmar em três bairros diferentes (distantes da base onde estavam instalados) somando-os para concluir a favela fílmica. Para a escolha das locações, o próprio Cacá, portando uma Mini-DV visitou as favelas e filmou tudo que podia aproveitar, reunindo várias horas de material para ser mostrado aos diretores de arte e produção. Este procedimento colaborou com a fidelidade em que a favela “fictícia” é apresentada na tela.


Uma locação chama a atenção em especial: um rio, ou melhor, valão, que tem suas margens cobertas de lixo, onde supostamente Antônio nasceu, segundo Cacá, foi uma das mais difíceis de encontrar. Descoberto ao acaso, o valão encontra-se na periferia da favela e é de difícil acesso. Valeu à pena a descoberta, pois o riacho poluído que contorna os casebres abriga as melhores e mais significativas cenas do longa.

O personagem de José Wilker, Antônio, curiosamente teve origem em um personagem de Deus é Brasileiro, um homem com câncer, que quase não aparece. Cacá Diegues sentiu então a necessidade de desenvolver aquele personagem, personificando um Antônio astrofísico, reconhecido mundialmente e que desde jovem mora nos Estados Unidos, que acredita poder controlar o mundo (o seu e de todos os seres) através da razão, das estrelas, das teorias da física, como se estivesse sempre olhando para o alto, esquecendo seu real universo, o planeta terra e seus problemas cotidianos. Ao entrar em contato com a pobreza e a realidade das grandes favelas cariocas, Antônio tem atitudes que demonstram sua distância deste mundo, como passar creme nas mãos após andar de motocicleta e exigir água mineral na casa de uma mãe de santo pobre. Audácia, arrogância e uma bomba atômica de sentimentos auto-reprimidos prestes a explodir. Assim pode-se resumir a personalidade de Antônio. José Wilker consegue transmitir muito bem estes sentimentos, lembrando a atual fase catatônica de Bill Murray em Flores Partidas (Broken Flowers - 2005 - Jim Jarmusch). O roteiro também leva a uma tênue semelhança, ao analisarmos que em Flores Partidas o personagem de Bill Murray encabeça uma jornada ao passado para conhecer um filho que até então não sabia da existência.

No início do “percurso”, Antônio conhece Mosca (Sérgio Malheiros), Neto da Mãe Santinha (Léa Garcia). Mosca trabalha como “aviãozinho” entregando drogas para os traficantes do morro e serve como uma espécie de guia para Antônio em sua jornada pela realidade. Em cinco dias, Antônio aprende com Mosca muito mais que em todos os seus anos como astrofísico.

Um filme bem cuidado em todos os aspectos. Uma película de cunho emocional, realista, e com um bom toque de espiritualidade.

Mário Pertile
Posted on 4/11/2008 by Mário Pertile and filed under , | 0 Comments »

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